Rio de Janeiro, 19 de Maio de 2024

Mulheres árabes - O charme sem véu

Beleza árabe
 
Muita gente torceu o nariz quando Giovanna Antonelli apareceu em horário nobre na pele da muçulmana Jade na novela O clone, encerrada mês passado. Para os detratores de Gloria Perez, autora da trama que virou fenômeno de audiência, Giovanna era sensual demais para uma mulher árabe. Isso sem falar no resto da turma: Nívea Stelman, Letícia Sabatella, Ingra Liberato e a espevitadíssima Stephany Brito. Um olhar mais atento, contudo, revela que o mundo árabe tem beldades a granel. Não faltam exemplos de mulheres femininas, modernas e muito sexys para mostrar que não passa de estereótipo o mito disseminado no Ocidente de que as árabes são mulheres peludas que escondem o narigão atrás de um chador.

Uma delas é a modelo Afef Jnifen, 38, uma das celebridades mais fotografadas da Itália. Filha de um diplomata tunisiano, Jnifen nasceu na Líbia e estudou na França. As 20 anos, já havia desfilado para a Maison Chanel, Giorgio Armani e Jean Paul Gautier. A fama lhe rendeu vultosos contratos para apresentar programas na TV italiana. Freqüentando as melhores rodas de Milão e Roma, ela é um exemplo de mulher moderna e bem-sucedida. Fala quatro idiomas e ganha muito dinheiro. Como não bastasse, casou-se ano passado com o solteirão mais cobiçado do país: o arquimilionário Marco Tronchetti, presidente do grupo Pirelli.

Se Jnifen virou a sensação do jet-set italiano, a rainha Rania tem status de pop star na Jodânia. Mulher do rei Abdullah, ela é a primeira-dama mais clicada do mundo árabe e figurinha fácil nas páginas de revistas européias. Nascida no Kuwait, há 32 anos, filha de pais palestinos, Rania ganhou fama por sua paixão por jóias e vestidos caros. Elegante, não esconde de ninguém que se sente mais à vontade batendo pernas nos boulevards parisienses que debaixo do sol escaldante do Deserto de Negev. Os tradicionais líderes religiosos não economizam farpas, alardeando à população que a rainha-patricinha passeia pela Europa enquanto Israel bombardeia a casa de seus pais na Cisjordânia. Sem dar a menor bola, a maioria adora incondicionalmente o glamour de Rania, que corajosamente puxa a fila do movimento feminista na Jordânia.

Ela está envolvida em várias campanhas pela expansão dos direitos da mulher em países árabes - mesmo a contra-gosto dos religiosos. Graças a uma campanha capitaneada por ela, bater em mulher virou crime na Jordânia. Durante as visitas oficiais do rei Abdullah a outros líderes árabes tradicionais, Rania causa saia-justa diplomática ao insistir em se sentar ao lado do marido. Em seu país, ela vive como uma mulher ocidental, longe das regalias de rainha: dispensa motoristas, é fã de música americana e é comum vê-la levando os três filhos ao Hard Rock Café da capital Amã.

É verdade que a vida de Rania não pode ser tomada como padrão. Ser mulher no mundo árabe não é coisa fácil. Mais da metade delas não sabe ler nem escrever. Se no Kuwait elas não podem votar, na Arábia Saudita são proibidas de dirigir e só há sete meses ganharam o direito de ter uma carteira de identidade. Ali pertinho, as egípcias são proibidas de viajar para fora do país sem a autorização dos maridos. Segundo as Nações Unidas, no mundo árabe menos de 4% das mulheres ocupam cargos públicos - número três vezes menor do que no Ocidente.

No entanto, nem toda repressão de muçulmanos intransigentes foi capaz de deter a ascensão meteórica das 4 Cats, um quarteto de garotas libanesas formado em 1997 à imagem e semelhança das Spice Girls. Quem teve a idéia de reunir quatro mulherões para aproveitar o sucesso das inglesinhas foi o empresário Gassan Rahbani, que selecionou para a função três modelos e a miss Líbano Dalida Shammaai. Bem mais comportadas que as inglesas, as quatro se vestem da maneira ocidental, mas com algumas restrições: o figurino permite no máximo uma calça jeans tradicional e raramente as garotas mostram o umbigo para os fãs. Como as Spice Girls, elas são péssimas cantoras e dançam pior ainda. O golpe de mestre foi reunir quatro bonitonas e transformar canções árabes tradicionais em baladas pop. As 4 Cats conquistaram uma legião de adoradores em um mundo carente de artistas. Tornaram-se tão populares que seus álbuns ultrapassam sempre a casa de um milhão de cópias vendidas.

Ainda que devagar, os homens árabes - até mesmo os mais radicas - vão dando o braço a torcer. Na Líbia, o truculento coronel Muamar Kadafi, que comanda o país com mão pesada, tem uma equipe de guarda-costas toda composta por mulheres. No Líbano e no Qatar, grupos feministas estão a um passo de aprovar leis regulamentando o divórcio e o direito à herança. Há algum tempo, a poligamia já é crime na Tunísia, vizinha do mesmo Marrocos onde moravam Tio Ali e Zoraide. As marroquinas, aliás, têm direito ao divórcio caso o marido escolha uma segunda esposa - mesmo que na imaginaçõ de Gloria Perez elas tenham de sofrer até o último capítulo. A autora é conhecida por sua imaginação fértil. Basta lembrar que ela escreveu um folhetim no qual um cientista brasileiro produzia um clone humano. Pior: conseguiu convencer meio mundo que chegar a Fez, no Marrocos, era como pegar uma ponte aérea para São Paulo. Porém, antes de arrastar Gloria Perez pela Medina, é bom saber que pelo menos Jade não foi mais um delírio seu.

Cristiano Dias

AFP
As libanesas do

As libanesas do "4 Cats": semelhança com as Spice Girls não é mera coincidência

 

Crédito:Luiz Affonso

Autor:Cristiano Dias

Fonte:Jornal do Brasil