Rio de Janeiro, 17 de Maio de 2024

Faro extraordinário

Homens infiéis, acautelem-se. Pesquisadores americanos comprovaram que as mulheres têm um olfato privilegiado, mais sensível que o dos parceiros. O faro feminino, capaz de captar até aromas sutis no colarinho do marido, é estimulado pelo estrogênio, o mesmo hormônio que protege as mulheres de doenças cardíacas. A sensibilidade de voluntários de ambos os sexos foi testada no Monell Chemical Senses Center, instituto dedicado ao estudo dos sentidos que fica na cidade americana de Filadélfia.

A experiência dividiu-se em 30 sessões, com intervalos de dois dias cada uma. Aplicaram-se os mesmos aromas a homens e mulheres de várias idades. A concentração dos odores diminuía a cada sessão, mas ainda assim o desempenho das mulheres melhorava, como se a repetição do contato com aqueles cheiros aguçasse habilidades. Com os homens, esse aprendizado não ocorreu. “Alguns experimentos haviam indicado a superioridade feminina nesse campo, mas a novidade foi descobrir que a mulher fica mais sensível a cada exposição”, disse a Época a cientista Pamela Danton, uma das autoras da pesquisa. Somente as mulheres jovens conseguiram identificar o cheiro adocicado de uma substância química conhecida como benzaldeído. O estudo foi publicado na semana passada pela revista Nature Neuroscience.

Para comprovar que o fenômeno tem origem hormonal, os cientistas analisaram a performance feminina em diferentes fases da vida. A prova de fogo foi a comparação de mulheres jovens com quatro meninas (de 8 a 10 anos) e quatro voluntárias que já haviam passado pela menopausa (de 49 a 61 anos) e não faziam reposição de estrogênio. O desempenho do grupo em idade fértil foi superior.

A pesquisa traz informação útil aos estudiosos que tentam entender se as diferenças de habilidades entre os sexos são determinadas pela natureza ou fruto das experiências. “Mas essa dúvida vai persistir por muito tempo”, acredita Pamela. “Nosso trabalho mostra um fenômeno que só se manifesta no caso específico dos cheiros.”

A superioridade do olfato feminino já serviu de combustível para a guerra dos sexos. Um estudo publicado no New York Medical Journal em 1884 sustentou que os homens eram os mais sensíveis aos odores. Descobriu-se anos mais tarde que a pesquisa fora manipulada grosseiramente. Os pesquisadores chauvinistas escamotearam detalhes importantes do experimento, como a metodologia e a idade dos participantes.

Outras avaliações foram realizadas ao longo do século XX. O trabalho mais abrangente em número de participantes foi patrocinado pela National Geographic Society e publicado em 1986. Dez milhões de pessoas de todo o mundo receberam um questionário acompanhado de um kit com seis odores em cápsulas. Cerca de 1,5 milhão delas responderam às perguntas. A análise do desempenho dos americanos (1,2 milhão de pessoas entre 10 e 90 anos) revelou que em geral as mulheres têm melhor olfato. A sensibilidade decresce ao longo do tempo nos dois sexos, mas elas conseguem manter médias mais elevadas até a quinta década de vida.

As inusitadas conclusões dos pesquisadores são observadas de perto pelos fabricantes de perfume. A companhia Givaudan-Roure, investe em pesquisa para manter-se entre as líderes do mercado de fragrâncias finas, que movimenta US$ 5 bilhões nos Estados Unidos. Munidos de um “cheirador” portátil, técnicos captam potenciais aromas em viagens às florestas da Costa Rica ou às praias brasileiras. “O odor funciona como um trampolim para as lembranças mais que qualquer outro estímulo, inclusive a música”, comenta a neuropsiquiatra Rachel Herz, do Monell Chemical Senses Center. “Por isso a indústria tenta a todo custo facilitar essa conexão com novos produtos”, resume.

Rachel Herz é outra estudiosa das peculiaridades do olfato feminino. Numa pesquisa publicada no ano passado, ela descobriu que a habilidade das mulheres em reconhecer odores funciona como parâmetro na escolha de parceiros. Foram entrevistados 231 estudantes de ambos os sexos na Universidade Brown, em Providence, capital de Rhode Island. Uma parte considerável das jovens disse dar mais importância ao cheiro dos rapazes que à roupa que vestem.

Crédito:Luiz Affonso

Autor:Cristiane Segatto

Fonte:Época