Rio de Janeiro, 11 de Maio de 2024

Terceira idade em harmonia com o Rio

Nada de pernas torneadas, corpo violão, pele lisa e sorriso de propaganda de pasta de dente. Também esqueça os homens atléticos percorrendo o calçadão de Copacabana. A capital que vende ao turista a imagem da juventude dourada da Zona Sul, com corpos esculturais, está a caminho da terceira idade.

O secretário-geral da ONU, Kofi Annan, disse na Assembléia Mundial sobre Envelhecimento, na segunda-feira, em Madri, que, nos próximos 50 anos, o número de pessoas com mais de 60 anos vai mais que quadruplicar no mundo, passando de 600 milhões para quase 2 bilhões. O envelhecimento da população se deve à baixa taxa de fecundidade e ao aumento da expectativa de vida. No Brasil, o Rio é a cidade com maior número de idosos proporcionalmente à sua população. São 850 mil os cariocas com mais de 60 anos, 12,1% dos habitantes, concentrados principalmente em Copacabana - São Paulo é a segunda cidade do ranking, com 8,7%, e Belo Horizonte, a terceira, com 8,3%.

Cidade ideal - Por mais que a turma da terceira idade não seja - ainda - parte do cartão-postal do Rio, eles vivem a cidade como ninguém. Em quiosques próximos ao Posto 6, são 40% dos clientes. ""Às 5h começam a chegar para a caminhada. Às 6h, vem a turma da natação"", conta Antônio de Oliveira, funcionário de um quiosque. Os jovens dos anos 50 - do nascimento da Bossa Nova e da despedida da seleção de camisa branca - não se sentem excluídos da imagem do carioca saudável. ""Eu cultivo isso"", orgulha-se o desembargador aposentado Pedro Ligeiro, 74. Com três pontes de safena, ele mantém o vigor com caminhadas matinais no calçadão. ""O Rio é a cidade ideal. Quer religião? Olhe para o Cristo Redentor. Quer filosofar? Olhe o mar. Quer prazer? Dê um mergulho"", sugere.

Projetos para o futuro? ""Viver."" A pronta resposta de Pedro é compartilhada por Refka Canetti, 75, Sirarpi Kiriktzian, 80, Sara Medeiros de Albuquerque, 84, e Dylza da 9Costa, 73. Elas são três turcas vindas ao Rio ainda adolescentes ""atrás de marido"" e uma carioca da gema, amigas que não trocam a cidade por nenhum lugar no mundo. Bate-papos no Posto 6, caminhadas e um mergulho na Praia do Arpoador fazem da capital fluminense ""o lugar da melhor velhice"".

Mercado - De olho nesse mercado crescente, multiplicam-se as opções de lazer e turismo. ""O Rio está se especializando na diversão para idosos"", acredita Pedro, que freqüenta bailes de gafieira com a esposa, Cândida, 71. ""O baile pára para ver a gente dançar"", conta o advogado, que se orgulha de ter jogado no Flamengo em fins dos anos 40, com vários craques da seleção de 50.

O empresário André Schecheter percebeu a oportunidade em 1995, quando transportou a idéia de um hotel de luxo para idosos dos Estados Unidos para o Rio. O Cristal Palace Residence, em Copacabana, foi o pioneiro no Brasil e ainda é o único na cidade. Com as 24 suítes ocupadas - 80% por moradores fixos, que pagam em média R$ 3.500 mensais -, o hotel oferece café da manhã, almoço, jantar, plantão de enfermagem, bingo e acompanhamento a passeios. ""Não se pode excluir o idoso da sociedade. E Copacabana está perto de tudo"", justifica.

Empresas cariocas como a Cratratak, sintonizadas com pesquisas apontando para um maior rendimento da terceira idade em atividades que não exigem esforço físico e complicadas tecnologias, decidiram contratar idosos. Apesar de a escolaridade do brasileiro com mais de 60 anos ser de três anos - média que esconde 5,5 milhões que nunca estudaram -, segundo especialistas, funcionários mais velhos faltam menos ao trabalho, mostram mais realização profissional e dão mais valor ao trabalho.

O psicólogo inglês Peter Warr, da Universidade Sheffield, explica que habilidades como força e memória, que declinam com a idade, não são cruciais para a maioria dos trabalhos em uma economia baseada em serviços.

A Secretaria Municipal da Terceira Idade, em parceria com a do Trabalho, está formando o Balcão de Emprego para a Terceira Idade. Quinhentos cariocas com mais de 60 anos já encaminharam seus currículos e serão cadastrados em banco de dados informatizado.

Crédito:Fatima Nazareth

Autor:Daniela Dariano

Fonte:Jornal do Brasil